A GATILHADA
O
quê acontece quando você dispara uma arma?
Esta explanação se aplica à
imensa maioria das pessoas que tentam utilizar uma arma de fogo pela primeira
vez e os que já atiram, mas não conseguem agrupamentos aceitáveis.
Quantas vezes você já tentou
acertar latas de cerveja num sítio afastado e errou?
Provavelmente muitas. É
decepcionante para o atirador inexperiente o seu primeiro contato com uma arma
de fogo. Aconteceu comigo e já vi acontecer com muita gente. A verdade é que
segurar uma arma de fogo é uma tarefa difícil, estragamos um belo disparo de
maneira totalmente involuntária, e o pior é que a “macheza” nos impede de
localizarmos a falha e pioramos cada vez mais sem sabermos como consertar o
problema, culpa-se a arma, o cano de duas polegadas, a munição, o vento, a
guerra fria, alta do dólar, e até; eventualmente, o atirador...
Se você é um dos muitos que não
conseguem acertar uma geladeira à vinte metros com cem por cento de êxito como
eu era anos atrás, siga-me e gaste uns poucos minutos da sua vida assimilando
uma rápida teoria.
Como funciona o tiro:
1) Ao enquadrar o alvo e
apertar o gatilho, seu organismo antecipa dois fenômenos; o tranco da arma
contra sua mão e o estampido.
2) No fugaz momento do tiro,
você, inconscientemente, empurra a arma para frente e para baixo na vã
tentativa de defender-se do tranco e fecha seus olhos prevendo o estampido; e o
quê acontece?
3) O disparo sai totalmente
desalinhado em relação ao ponto desejado.
Chamamos este fenômeno de
“gatilhada”, uma coisa comum praticamente a todos os seres humanos não
habituados ao armamento leve. E aí você dirá:
“Eu sou macho; não tenho medo de arma...” bobagem, você é normal, e não
é normal apreciar golpes violentos e estampidos.
Quando comecei no tiro meu
agrupamento à quinze metros tinha uns dois metros de altura por um metro de
largura.
Uma evidência da
"gatilhada" é o susto que alguns atiradores iniciantes notam quando a
munição falha, sobretudo quando usam armas em calibre 22, um calibre famoso
pela sua maior incidência de falhas.
Como
evitar a “gatilhada”
O segredo está em realizar
disparos sem saber o que virá, se um tiro ou um mero clique. Para isto você
precisará de um revólver, algumas cápsulas deflagradas e munição real.
A técnica consiste em carregar
a arma com uma munição real (com espoleta, pólvora e projétil) e as câmaras
restantes com cápsulas deflagradas*.
A razão para utilizarmos
cápsulas deflagradas nas câmaras restantes é simples; com o hábito, mesmo o
mais inexperiente atirador torna-se capaz de visualizar ou a luz ambiente, ou
os culotes das munições, através do cilindro, sendo então, capaz de dizer se o
que virá na seqüência será um clique mecânico ou um bang de disparo, as
cápsulas evitam isto.
1) tome posição diante do alvo.
2) coloque uma munição real no cilindro do seu revólver e complete o
cilindro com cápsulas deflagradas
3) com a arma aberta, gire o cilindro do revólver e pare-o com a mão fraca
(aquela que não empunha a arma no disparo) de maneira que você não seja capaz
de dizer onde está a munição real
4) uma vez parado o cilindro, feche-o sem saber onde está a munição real
(se você tentar fechá-lo enquanto ele gira existirá a possibilidade de quebrar
o retém do cilindro, por isto nunca feche o cilindro girando como é comum nos
filmes americanos).
5) aponte a arma para o alvo e aperte o gatilho procurando manter a arma
alinhada com o alvo, neste momento vem a dúvida: Ouvirei um clique ou um bang?
6) ouvindo um clique aperte mais uma vez, se obtiver mais um clique abra a
arma, gire o cilindro novamente , feche-o e repita tudo de novo;ao ouvir um
bang, abra a arma e remova a cápsula diretamente à direita da cápsula recém
disparada (está prática serve para assegurar que o desgaste na arma ocorrerá
por igual, promove um “rodízio” entre as câmaras); coloque uma nova munição na
câmara vazia e repita o processo
Obviamente, se a revólver
possui seis câmaras e você já deu cinco cliques, duas coisa podem acontecer, ou
o próximo exercício resultará em bang, ou a munição falhou, é por isso que eu
recomendo só duas tentativas.
Como o leitor já deve ter
notado, o exercício é uma espécie de “roleta russa” contra o alvo. O atirador
deve atentar para sua mão, deve verificar a cada tentativa se sua mão temeu, se
seus olhos se fecharam de maneira indesejável ao controle da arma e se seu
coração disparou com a ansiedade.
O objetivo desta técnica é
permitir ao atirador que aprenda a controlar seu medo, desafiá-lo e medi-lo.
Com o tempo a confiança cresce e os disparos tornam-se mais precisos. Acredito
que umas poucas dezenas de tiros neste sistema dão melhor resultado que várias
centenas queimadas levianamente.
Suspeito que seja pelo desconhecimento
da existência de munição real na arma que muitos tiros acidentais acabam por
serem fatais, o atirador ou curioso não treme por crer que a arma está
descarregada.
Lembre-se que aquela máxima do tiro de precisão "aperte o gatilho
lentamente e espere o tiro como uma surpresa” é válida no começo, mas o tiro de combate tem como premissa o
momento, é o atirador que aproveita o melhor momento para liberar o tiro,
por isto, após certo tempo, o atirador deve apertar o gatilho mais rapidamente,
escolhendo o momento do tiro.
Foi esta a técnica que aprendi
com um atirador veterano, foi ela que me possibilitou saltar de segundo pior
atirador do meu clube para primeiro em cerca de quatro meses. Ela é descrita,
embora com menos pormenores, num manual do exército brasileiro chamado
"ARMAS CURTAS”, da década de setenta, porém é uma técnica ignorada pelos
assim chamados “instrutores de tiro” que iludem civis comuns e vigilantes por
este país afora.
Sem controle não há o que
fazer, seja no tiro de precisão, seja no tiro instintivo, é lógico que
deveríamos disparar milhares e milhares de tiros até nos considerarmos bons
atiradores, mas não estamos nos EUA, onde mil tiros de 7,62 X 39 chegam a
custar cem dólares, estamos no Brasil e aqui a munição é cara, até mesmo a
recarregada, sendo assim, faça valer cada tiro.
A técnica que descrevi aqui é
comumente empregada pelo pessoal do tiro prático, na única oportunidade que
tive de competir com membros do IPSC brasileiro percebi que um atirador
ensinava justamente esta técnica para uma menina que lá estava.
Sou favorável ao ensino baseado
na relação custo / benefício, é imperativo que um modelo de treinamento básico
seja desenvolvido a fim de permitir que aqueles que não podem comprar caminhões
de munição também dominem suas armas. Até onde me permite a memória, creio que
levei umas seis semanas e uns cento e oitenta tiros para atingir uma silhueta
humanoide no "garrafão" colocada na linha de 25 metros com cem por
cento de acertos. Devo ter apertado o gatilho umas mil vezes, logo, levei uns
oitocentos e vinte sustos, e estes sustos resolveram uma pontaria que até
então, parecia um caso perdido.
É sabido que o tiro em seco
(sem munição) também é importante, mas isto é outra coisa, muitas armas sofrem
com o tiro em seco (as bem desenhadas, não!). Quanto a isto, só posso dizer que
os revólveres TAURUS com barra de percussão são os melhores do Brasil, e que
todos os desenhos de inspiração S&W são ruins, o percussor montado no cão
simplesmente massacra a estrutura da arma no tiro em seco e devemos evitar
estas armas.
Pistolas dificultam o
treinamento para controle da gatilhada, é preciso usar um revólver. Daria
trabalho demais misturar munições sem carga para completarmos os carregadores,
mas é uma forma útil para nos habituarmos ao "remanejar" rapidamente
o ferrolho após uma falha de munição, coisa útil pois muitos atiradores ficam
olhando suas pistolas quando a espoleta falha, o que seria fatal num confronto,
por outro lado diz-se que é preciso aguardar alguns segundos após a falha antes
de "remanejar" o ferrolho pois algumas vezes a espoleta segundos
depois (fenômeno do "hangfire").
Ótimo, agora que você já sabe
atirar, pode ir fazer aquele curso com um instrutor israelense, munição
israelense, alvos palestinos e comida kosher no coffee break ...
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